Fernanda Belga Ottoni Porto1,2,3; Rafael Mourão Agostini3,4,5; Raphael Stehling Fernandes5; Ana Paula Carneiro Rodrigues1; Julia Clara Dias Norberto Ferreira1; Fabrício Ribeiro Laender5; Rodrigo dos Anjos Versiani6; Aliança Profissional para Terapia Gênica
DOI: 10.17545/eOftalmo/2023.0042
Este artigo pertence à Edição Especial Dominando a arte da cirurgia vitreorretiniana: técnicas e dicas
Luxturna® (Voretigeno Neparvovec-rzyl) é a primeira terapia gênica aprovada pelo FDA e Anvisa, projetada para abordar a mutação genética do gene RPE65, relacionada a amaurose congênita de Leber (LCA) e retinose pigmentar. Esse tratamento inovador não apenas promete restaurar a visão, mas também representa uma mudança de paradigma na forma como abordamos distúrbios genéticos hereditários.
Neste vídeo, mostramos a primeira terapia com o Luxturna® realizada por nosso grupo em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. A Aliança Profissional para Terapia Gênica é o primeiro centro de terapia gênica de Minas Gerais e o terceiro da América do Sul. Este também é o primeiro tratamento com Luxturna® no Brasil fora do estado de São Paulo. Apresentamos o olho direito de uma jovem de 18 anos, com história de baixa visão desde o nascimento. Ela foi inicialmente diagnosticada pela Dra. Fernanda Porto com amaurose congênita de Leber aos dois anos de idade. Variantes bialélicas patogênicas no RPE65 foram identificadas aos 16 anos de idade. A paciente evoluiu com perda progressiva da visão central e periférica, assim como da visão noturna, ao longo do tempo. As retinas eram translucentes, os vasos retinianos estavam atenuados e a retina estava relativamente preservada no polo posterior, mas a atrofia macular já estava presente inferiormente em ambos os olhos, afetando a parafovea, perifovea e também a área foveal. A OCT revelou preservação de células fotorreceptoras em ambos os olhos. Ela apresentava ainda ceratocone em ambos os olhos.
Inicialmente, foi realizada uma vitrectomia posterior padrão assistida por Chandelier de 23-gauge. Optamos por corar o hialoide posterior com acetato de triancinolona para melhorar a visualização, pois a hialoide posterior pode estar muito aderida à retina em pacientes tão jovens, e seu descolamento cirúrgico às vezes pode ser muito desafiador. Após a vitrectomia central, realizamos um corte da base vítrea sob indentação escleral externa. Neste momento, também procuramos por lesões periféricas que pudessem levar a um descolamento de retina. O Luxturna® foi preparado pela equipe farmacêutica manipuladora e foi entregue em condições estéreis à sala de cirurgia seguindo as diretrizes da indústria. Optamos por usar uma seringa de injeção de microdose com uma cânula sub-retiniana de 41-gauge acoplada ao controle automatizado de fluidos viscosos (VFC). A retina foi perfurada pela cânula de 41-gauge e 0,3 ml do medicamento foram injetados no espaço sub-retiniano, criando uma bolha no polo posterior. Também fizemos uma segunda bolha com 0,2 ml na retina nasal visando melhorar o campo visual temporal da paciente. Por fim, realizamos uma troca de fluido-ar com uma cânula de ponta suave e fechamos todos os quatro portos esclerais com suturas de Vycril 7-0.
A terapia com Luxturna® abre caminho para um futuro emocionante no campo da medicina de precisão. Essa terapia gênica traz uma nova esperança para aqueles que enfrentam a perda de visão. Cada olhar conta uma história e contribuir para a reescrita dessas narrativas é verdadeiramente gratificante. Que este marco não só signifique uma conquista, mas também, à medida que a tecnologia avance, abra portas para o desenvolvimento de terapias similares direcionadas a um espectro mais amplo de distúrbios genéticos. Esperamos que as questões relacionadas à acessibilidade, custo e distribuição equitativa de terapias avançadas possam ser resolvidas em um futuro próximo, trazendo esperança para aqueles que mais precisam.
REFERÊNCIAS
1. Russell S, Bennett J, Wellman J A, Chung D C, Yu Z F, Tillman A, et al. Efficacy and safety of voretigene neparvovec (AAV2-hRPE65v2) in patients with RPE65-mediated inherited retinal dystrophy: a randomized, controlled, open-label, phase 3 trial. Lancet. 2017;390(10097):849-860.
2. Davis J L, Gregori N Z, MacLaren R E, Lam B L. Surgical technique for subretinal gene therapy in humans with inherited retinal degeneration. Retina. 2019;39;Suppl 1:S2-S8.
3. Takahashi K, Morizane Y, Hisatomi T, Tachibana T, Kimura S, Hosokawa M M, et al. The influence of subretinal injection pressure on the microstructure of the monkey retina. PLOS ONE. 2018;13(12):e0209996.
4. Xue K, Groppe M, Salvetti A P, MacLaren R E. Technique of retinal gene therapy: delivery of viral vector into the subretinal space. Eye. 2017;31(9):1308-1316.
5. Scruggs B A, Huber Martins V Jr., Mariana Matioli da P, Katie K, Mark E P, Paul Y, et al. Injection pressure levels for creating blebs during subretinal gene therapy. Gene Ther. 2022 November; 29(10-11):601-607.
INFORMAÇÃO DOS AUTORES |
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»Fernanda Belga Ottoni Porto https://orcid.org/0000-0002-4308-1766 http://lattes.cnpq.br/3705547122177092 |
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»Rafael Mourão Agostini http://lattes.cnpq.br/4837024324055533 https://orcid.org/0009-0004-8622-6218 |
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»Julia Clara Dias Norberto Ferreira http://lattes.cnpq.br/4624378177317170 https://orcid.org/0009-0002-5457-8847 |
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» Fabrício Ribeiro Laender http://lattes.cnpq.br/9393437510484424 https://orcid.org/0009-0001-8308-7572 |
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» Raphael Stehling Fernandes http://lattes.cnpq.br/2220253299512280 https://orcid.org/0009-0006-6117-2297 |
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» Ana Paula Carneiro Rodrigues http://lattes.cnpq.br/2529017243807277 https://orcid.org/0000-0002-9459-0835 |
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» Rodrigo dos Anjos Versiani http://lattes.cnpq.br/0589629829513519 https://orcid.org/0009-0001-2065-6491 |
Financiamento: Declaram não haver.
Conflitos de Interesse: Declaram não haver.
Recebido em:
19 de Dezembro de 2023.
Aceito em:
8 de Janeiro de 2024.