Artigo

Acesso aberto Revisado por pares

480

Visualizações

 


Casos Clínicos Discutidos

Hamartoma astrocítico da retina versus osteoma de coroide: um caso interessante

Retinal astrocytic hamartoma versus choroidal osteoma: an interesting case

Hamartoma astrocítico de la retina versus osteoma de la coroide: un caso interesante

Raphael Pereira da Silva; Leonardo Dias Alencar; Carlos Augusto Moreira-Neto

DOI: 10.17545/eoftalmo/2018.0029

RESUMO

Este estudo de caso clínico apresenta uma discussão interessante sobre o diagnóstico diferencial entre osteoma de coroide e hamartoma astrocítico da retina. Um individuo saudável do sexo masculino, de 19 anos de idade, apresentou uma mancha escura no campo temporal do olho esquerdo com 1 mês de evolução. O exame de fundo ocular do olho esquerdo revelou uma placa laranja-amarelada bem circunscrita e elevada ao redor do disco óptico e hemorragias na região macular. O paciente foi submetido a angiografia com fluoresceína, ultrassonografia ocular, tomografia de coerência óptica (OCT) e angiotomografia de coerência óptica (OCTA). Uma massa amarelada, espaços opticamente vazios e calcificações foram detectados na OCT, além das hemorragias maculares que são características inerentes aos dois tumores, dificultando enormemente o diagnóstico etiológico. Uma tomografia de coerência óptica com profundidade de imagem aprimorada e uma avaliação citológica por biópsia por agulha fina podem ser ferramentas úteis para esclarecer o diagnóstico.

Palavras-chave: Tomografia de Coerência Óptica; Retina; Hamartoma; Osteoma; Coroide.

ABSTRACT

The clinical case presents an interesting discussion about differential diagnosis between choroidal osteoma and retinal astrocytic hamartoma. A healthy 19-year-old man presented with a dark spot on temporal field of the left eye with one month of evolution. Examination of the ocular fundus of the left eye revealed a well-circumscribed and elevated orange-yellow plaque around the optic disc and hemorrhages in the macular region. The patient was submitted to fluorescein angiography, ocular ultrasound, optical coherence tomography and optical coherence tomography angiography. The yellowish mass, the optically empty spaces and the calcifications seen in the optical coherence tomography, besides the macular hemorrhage are inherent characteristics of the two tumors, making it very difficult to reach the etiological diagnosis. An Enhanced depth imaging optical coherence tomography and a cytological evaluation through fine needle biopsy would be useful tools to clarify the diagnosis.

Keywords: Tomography Optical Coherence; Retina; Hamartoma; Osteoma; Choroid.

RESUMEN

Un individuo saludable del sexo masculino, de 19 años de edad, presentó una mancha oscura en el campo temporal del ojo izquierdo con 1 mes de evolución. El examen de fundo ocular del ojo izquierdo reveló una placa naranja-amarillada bastante incrustada y elevada alrededor del disco óptico y hemorragias en la región macular. Se sometió el paciente a angiografía con fluoresceína, ultrasonografía ocular, tomografía de coherencia óptica (OCT) y angiotomografía de coherencia óptica (OCTA). Se detectaron en la OCT una masa amarilla, espacios ópticamente vacíos y calcificaciones, además de las hemorragias maculares que son características propias a los dos tumores, lo que hace muy difícil el diagnóstico etiológico. Una tomografía de coherencia óptica con profundidad de imagen primoreada y una evaluación citológica por biopsia con aguja delgada pueden ser herramientas útiles al aclaramiento del diagnóstico.

Palabras-clave: Tomografía de Coherencia Óptica; Retina; Hamartoma; Osteoma; Coroides.

INTRODUÇÃO

O osteoma coróide (OC) é um tumor benigno e raro, composto por células ósseas maduras e mais prevalente no sexo feminino1. O OC está frequentemente localizado na região justapapilar ou macular e é unilateral na maioria dos casos2. A complicação mais comum do OC é a neovascularização coroidal (NVC), importante causa de perda visual, ocorrendo em até 31% dos casos3.

O hamartoma astrocítico da retina (HAR) é um tumor glial benigno que surge da camada de fibras nervosas da retina. Essa lesão representa o achado oftalmoscópico mais comum em pacientes com complexo de esclerose tuberosa; entretanto, essa massa também pode se manifestar como uma condição esporádica que aparece como uma massa amarelo-acinzentada, geralmente com vasos retinianos minimamente dilatados, tração retiniana fina e calcificação intrínseca reluzente4.

 

RELATO DE CASO

Um individuo caucasiano, do sexo masculino, de 19 anos de idade apresentou uma mancha escura no campo temporal do olho esquerdo com 1 mês de evolução. Ele não tinha outra história ocular, médica ou familiar relevante. Sua melhor acuidade visual corrigida foi 20/20 no olho direito e 20/20 no olho esquerdo. O exame de seu segmento anterior não era digno de nota, além de um exame normal de fundo de olho direito. A fundoscopia do olho esquerdo revelou uma placa laranja-amarelada peripapilar, bem circunscrita e elevada, e hemorragia na região macular (Figura 1A). A autofluorescência de fundo de olho (AFF) revelou uma lesão hiperautofluorescente ao longo da extensão do tumor e um hipoautor fluorescente na área de hemorragia (Figura 1B).

 


Figura 1. A: A retinografia mostrou uma placa laranja-amarelada bem circunscrita e elevada ao redor do disco óptico e hemorragias na região macular; B: A autofluorescência de fundo apresentou lesão hiperautofluorescente ao longo da extensão do tumor e hipoautor fluorescente na área de hemorragia.

 

Fotografia colorida de fundo de olho, ultrassonografia B-scan, angiografia fluorescente de fundo (AFF), tomografia de coerência óptica de domínio espectral (SD-OCT) (Heidelberg Engineering, Heidelberg, Alemanha) e angiografia por tomografia de coerência óptica (OCTA) (Optovue, Inc., Fremont , CA, EUA) foram realizados. A AFF do olho esquerdo e revelaram hiperfluorescência precoce e intensa coloração da lesão associada a áreas de bloqueio correspondentes à hemorragia (Figura 2). A ultrassonografia B-scan revelou lesão altamente ecogênica com sombra acústica posterior (Figura 3).

 


Figura 2. A angiografia fluorescente do olho esquerdo mostrou hiperfluorescência precoce e intensa coloração da lesão coróide associada a áreas de bloqueio correspondentes à hemorragia pré-retiniana.

 

 


Figura 3. A ultrassonografia B-scan revelou lesão altamente ecogênica com sombra acústica posterior.

 

O SD-OCT revelou uma lesão retiniana bem definida com espaços opticamente vazios (EOVs) e a presença de pontos hiperrefletores (Figura 4).

 


Figura 4. A tomografia por coerência óptica no domínio espectral mostrou uma lesão retiniana bem definida com espaços opticamente vazios e a presença de pontos hiperrefletores que sombreavam a coróide.

 

A OCTA demonstrou vasos tumorais nos plexos vasculares superficiais e a hemorragia pré-retiniana foi observada na OCT en-face (Figura 5).

 


Figura 5. A angiotomografia de coerência óptica revelou vasos tumorais nos plexos vasculares superficiais e a hemorragia pré-retiniana foi detectada na tomografia por coerência óptica.

 

O paciente recebeu três injeções intravítreas mensais consecutivas de um aflbercept (2,0 mg). Após 1 mês das injeções intravítreas finais do aflibercept, a OCTA revelou uma redução na área da hemorragia.

Além disso, foi realizada fotocoagulação com laser amarelo na margem temporal do tumor (Figura 6).

 


Figura 6. A retinografia e a autofluorescência do fundo mostraram o tumor após fotocoagulação com laser amarelo na margem temporal.

 

A acuidade visual final do paciente foi de 20/20, e houve melhora no defeito do campo visual no olho esquerdo após 2 meses de tratamento.

 

DISCUSSÃO

A única lesão peripapilar, amarelada, associada à hemorragia macular, nos levou a diferenciar dois tumores que poderiam ser calcificados, que, nessa topografia, são o OC e o HAR5.

O paciente não apresentou alterações sistêmicas como o complexo de esclerose tuberosa. A ultrassonografia ocular revelou uma lesão calcificada e uma hemorragia macular que poderia ser causada por uma membrana neovascular secundária ao OC. No entanto, na OCT, a lesão localizava-se na retina e não era possível avaliar a coróide devido ao sombreamento causado pelo tumor.

A análise do OC usando imagens ampliadas de EDI-OCT revelou um padrão típico esponjoso compreendendo pontos hiperreflectivos densos espalhados na matriz hiporrefletiva e uma estrutura multicamadas, provavelmente devido à presença de diferentes graus de calcificação dentro do tumor. Acredita-se que a tomografia computadorizada SD-OCT dos olhos com lesão amelanótica no fundo possa facilitar os clínicos a diferenciar os OCs de outras condições, como calcificações esclerocoroidianas, melanomas coroidais, metástase coróide e linfoma coroidal6-8.

Em relação ao EDI-OCT, Pichi et al. descreveu o tipo I na camada de fibras nervosas como plano e geralmente, tipo II com discreta elevação nas mesmas e tração retinal, tipo III com áreas luzentes com aspecto de “corroídas por traças” sugerindo calcificação envolvendo a retina interna e externa, e tipo IV com cavidades intralesionais opticamente vazias9.

A HAR manifesta características típicas em OCT, incluindo uma transição gradual de uma retina normal para uma massa opticamente hiperrefletiva com desorganização da retina, espaços característicos com aspecto de “corrídos por traças” e sombreamento posterior10-11.

A HAR está associada à esclerose tuberosa, mas pode aparecer como tumor esporádico, ocorrendo calcificação intralesional em cerca de metade dos casos, além de hemorragias e líquido sub-retiniano ser mais comuns em astrocitomas adquiridos12.

As complicações relacionadas à presença de hamartomas retinianos incluem hemorragia vítrea, anormalidades vasculares retinianas (incluindo telangiectasia, neovascularização e exsudação) e semeadura vítrea, caracteristicamente descritas em associação com cabeça do nervo óptico ou hamartomas astrocíticos epipapilares. De acordo com um relatório clínico-patológico, a hemorragia vítrea pode surgir da substância dos astrocitomas da retina ou do nervo óptico. Uma miríade de pequenos canais vasculares é confirmada como patológica13.

EDI-OCT e uma avaliação citológica por biópsia por agulha fina podem ser ferramentas úteis para esclarecer o diagnóstico etiológico deste caso.

 

REFERÊNCIAS

1. Gass JD, Guerry RK, Jack RL, Harris G. Choroidal osteoma. Arch Ophthalmol. 1978;96(3):428-35.

2. Aylward GW, Chang TS, Pautler SE, Gass JD. A long-term follow-up of choroidal osteoma. Arch Ophthalmol. 1998;116(10):1337-41.

3. Shields CL, Sun H, Demirci H, Shields JA. Factors predictive of tumor growth, tumor decalcification, choroidal neovascularization, and visual outcome in 74 eyes with choroidal osteoma. Arch Ophthalmol. 2005;123(12):1658-66.

4. Shields CL, Benevides R, Materin MA, Shields JA. Optical coherence tomography of retinal astrocytic hamartoma in 15 cases. Ophthalmology. 2006;113(9):1553-7.

5. Shields CL, Perez B, Materin MA, Mehta S, Shields JA. Optical coherence tomography of choroidal osteoma in 22 cases: evidence for photoreceptor atrophy over the decalcified portion of the tumor. Ophthalmology. 2007;114(12):e53-8.

6. Mello PC, Berensztejn P, Brasil OF. Enhanced depth imaging optical coherence tomography of choroidal osteoma with secondary neovascular membranes: report of two cases. Arq Bras Oftalmol. 2016;79(3):197-9.

7. Alameddine RM, Mansour AM, Kahtani E. Review of choroidal osteomas. Middle East Afr J Ophthalmol. 2014;21(3):244-50.

8. Yadav NK, Jayadev C, Rajendran A, Nagpal M. Recent developments in retinal lasers and delivery systems. Indian J Ophthalmol. 2014;62(1):50-4.

9. Pichi F, Massaro D, Serafino M, Carrai P, Giuliari GP, Shields CL, et al. RETINAL ASTROCYTIC HAMARTOMA: Optical Coherence Tomography Classification and Correlation With Tuberous Sclerosis Complex. Retina. 2016;36(6):1199-208.

10. Shields CL, Say EAT, Fuller T, Arora S, Samara WA, Shields JA. Retinal Astrocytic Hamartoma Arises in Nerve Fiber Layer and Shows “Moth-Eaten” Optically Empty Spaces on Optical Coherence Tomography. Ophthalmology. 2016;123(8):1809-16.

11. Mellen PL, Sioufi K, Shields JA, Shields CL. Invisible, honeycomb-like, cavitary retinal astrocytic hamartoma. Retin Cases Brief Rep. 2017. DOI: 10.1097/ ICB.0000000000000697

12. Shields JA, Shields CL, Ehya H, Buckley E, De Potter P. Atypical retinal astrocytic hamartoma diagnosed by fine-needle biopsy. Ophthalmology. 1996;103(6):949-52.

13. Kroll AJ, Ricker DP, Robb RM, Albert DM. Vitreous hemorrhage complicating retinal astrocytic hamartoma. Surv Ophthalmol. 1981;26(1):31-8.

 

Fonte de financiamento: declaram não haver

Parecer CEP: não aplicável

Conflito de interesses: declaram não haver

Recebido em: 30 de Maio de 2018.
Aceito em: 25 de Julho de 2018.


© 2024 Todos os Direitos Reservados