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Revisão Narrativa de Literatura

Tempo em ambiente externo, exposição à luz violeta e prevenção da miopia em crianças

Time outdoors, exposure to violet light and prevention of myopia in children

Tiempo en ambiente externo, exposición a la luz violeta y prevención de la miopía en niños

Milton Ruiz Alves1; Milton Ruiz Rodrigues Alves2; Aline Fioravanti Lui3; Keila Monteiro Carvalho4

DOI: 10.17545/eoftalmo/2018.0017

RESUMO

A prevalência de miopia está aumentando em todo o mundo. Evidências epidemiológicas sugerem que as crianças que dispensam mais tempo em ambientes externos ou ao ar livre são menos propensas a se tornarem míopes. Tem sido sugerido que o efeito protetor do tempo dispensado em ambiente externo envolve a liberação estimulada por luz de dopamina pela retina, uma vez que a dopamina inibe o crescimento ocular. Por outro lado, foi sugerido que a ausência da luz violeta (LV) em nosso mundo industrializado é o principal fator responsável pelo incremento atual da miopia. No entanto, faltam evidências convincentes de que a LV, de fato, previne a progressão da miopia.

Palavras-chave: Miopia; Ambiente Externo; Iluminação; Dopamina; Luz Violeta.

ABSTRACT

Prevalence of myopia is increasing worldwide. Epidemiological evidence suggests that children who spent more time outdoor are less likely to be or become myopic. It has been suggested that the mechanism of the protective effect of time outdoors involves light-stimulated released of dopamine from the retina, since increase of dopamine inhibits eye growth. On the other hand, too, it has been suggested that the absence of light violet (LV) in our industrialized world is a major contributing factor responsible for the recent epidemic increase in myopia. However, there is a lack of convincing evidence that the LV, in fact, suppressed myopia progression.

Keywords: Myopia; Environment; Illuminance; Dopamina; Violet Light.

RESUMEN

El predominio de miopía se está incrementando en todo el mundo. Evidencias epidemiológicas sugieren que los niños que pasan más tiempo en ambientes externos o al aire libre son menos propensos a volverse miopes. Se ha sugerido que el efecto protector del tiempo dispensado en ambiente externo involucra la liberación estimulada por luz de dopamina por la retina, una vez que la dopamina inhibe el crecimiento ocular. Por otro lado, se ha sugerido que la ausencia de la luz violeta (LV) en nuestro mundo industrializado es el principal factor responsable del incremento actual de la miopía. Sin embargo, faltan evidencias convincentes de que la LV, de hecho, previene la progresión de la miopía.

Palabras-clave: Miopía; Ambiente Externo; Iluminación; Dopamina; Luz Violeta.

1. MIOPIA

A miopia é, comumente, considerada uma desordem benigna porque a visão pode ser corrigida com óculos, lentes de contato e cirurgia refrativa1. Atualmente, perplexos, vivenciamos uma explosão na prevalência de miopia na Ásia Oriental, com 80-90% dos estudantes universitários míopes, sendo que 20% ou mais deles já manifestam miopia patológica1-4. O incremento da prevalência de miopia, nesta parte do mundo, tem sido associado à aumento na pressão educacional e à mudança no estilo de vida, incluindo diminuição do tempo gasto em ambiente externo2-6. O mesmo fenômeno tem sido observado em outras partes do mundo, porém de forma menos marcante7.

Um dos efeitos colaterais desta epidemia é o aumento substancial do número de pessoas portadoras de miopia patológica e por isso sujeitas ao desenvolvimento de várias afecções oculares que podem levar à perda visual ou à cegueira irreversível8 que, infortunadamente, não podem ser prevenidas pela correção óptica9. A prevalência de baixa visão atribuível à miopia patológica é de 0,2-1,4%, em populações asiáticas 9.

O aumento da prevalência de miopia em todo o mundo vem gerando demandas significativas em saúde pública e despertando um grande interesse na adoção de intervenções que possam impedir o seu aparecimento ou controlar a sua progressão em crianças em idade escolar. Os estudos até agora tiveram como alvo as propriedades ópticas do olho, o uso de agentes farmacológicos e a modificação de fatores ambientais10. O uso de lentes corretivas demonstrou pouca efetividade no controle da progressão da miopia11. A aplicação tópica de atropina a 0,01% parece ser hoje a intervenção mais promissora, mas o seu uso generalizado é limitado por efeitos colaterais e por problemas com a conformidade 12.

 

2. AMBIENTE EXTERNO

Estudos epidemiológicos sugerem que o aumento do tempo gasto em ambiente externo está associado a menor risco de progressão da miopia em crianças e adolescentes 6,10,13-15. Há evidências de que, também, exerce ação protetora contra a progressão da miopia em crianças já míopes9,16.

Estudos em modelos animais (pintainho, tree shreew e macaco) sugerem que olhos submetidos à elevados níveis de iluminação (1000-10.000 lux) permanecem mais hipermetropes que olhos expostos à níveis mais baixos de iluminação (500 lux). Esta diferença refrativa resulta do fato de que olhos submetidos à níveis mais altos de iluminação permanecem hipermetropes com refração estável, enquanto aqueles expostos à níveis mais baixos de iluminação apresentam desvio em direção à emetropia17.

A maioria dos estudos que avaliou o mecanismo de emetropização em modelos animais (pintainhos, tree shrew e macacos) de miopia desencadeada por deprivação visual e/ou lentes negativas usou níveis de iluminação muito baixa (100-500 lux). A exposição destes animais à níveis mais elevados de iluminação (15.000-28.000 lux) reduziu a taxa de progressão de miopia por deprivação visual, lente negativa ou por ambos17.

Vários mecanismos têm sido aventados para explicar o efeito protetor do ambiente externo contra a progressão da miopia em crianças. Parece não haver dúvidas de que é mínimo o papel exercido por objetos muito próximos, pupilas pequenas e níveis séricos elevados de vitamina D17. Por outro lado, sabe-se que sob estimulação luminosa, neurônios retínicos liberam dopamina (ativação de vias dopaminérgicas) 18. A atividade da dopamina (síntese, turnorver e liberação) é maior durante o dia e menor durante a noite (ciclo circadiano) 18. A ativação dopaminérgica tem sido implicada no desenvolvimento e controle da progressão da miopia em animais 19 e em crianças20. O nível de iluminação do ambiente externo poderia atuar como uma variável contínua: altos níveis de iluminação estariam associados com a estimulação de receptores D1R e baixos níveis de iluminação com a estimulação de receptores D2R21. O equilíbrio entre a ativação destes receptores retínicos modularia o desenvolvimento refrativo dos olhos de tal modo que a ativação dos receptores D1R os manteriam hipermetropes e a ativação dos receptores D2R os conduziriam à miopia. 21

 

3. LUZ VIOLETA

Estudo recente de Torii et al22 mostrou que a luz violeta (LV) de 360-400nm de comprimento de onda suprimiu a progressão da miopia em pintainhos com miopia induzida por deprivação visual e defocus hipermetrópico por lente -9,00 D e, também, ativou o gene supressor de miopia (EGR1). Neste estudo, a transmissão de LV pelas lentes oftálmicas (óculos) e lentes de contato suprimiu a progressão da miopia, em crianças míopes. Os autores concluíram de seu estudo que a iluminação artificial deveria ser revisada para incluir um componente UV, como na luz solar.

Schaeffel e Smith III23 consideraram a proposta de Torii et al.22 provocante, uma vez que a exposição à luz de curto comprimento de onda tem sido tema de investigação há décadas, sabendo-se que induz foto oxidação e degeneração da retina24. Schaeffel e Smith III23 apontaram limitações importantes no estudo de Torii et al.22. O fato de as lentes -9,00 D serem coladas não permitindo remoção para limpeza favoreceu o acúmulo de sujeira comprometendo a óptica e determinando efeitos desfocantes que interferiram nos resultados dos experimentos. Está bem estabelecido em várias espécies, incluindo pintainhos, que a magnitude de miopia axial induzida se relaciona diretamente ao grau de degradação da imagem produzida por lentes difusoras23. Scheffel et al. 25 ressaltaram que em contraste com os seres humanos, os meios ópticos oculares dos pintainhos transmitem luz UV até pelo menos 350 nm e que na retina destes animais existem receptores UV, por isso não foi inesperado o achado do gene regulado pela LV. Para contestar também os achados de que a progressão da miopia em escolares foi influenciada pela transmissão de LV, Schaeffel e Smith III23 verificaram que os escolares do grupo controle que usaram lentes que bloquearam a LV eram os mais jovens e os mais míopes. Portanto, parece muito razoável argumentar que o início da miopia nestes escolares teria ocorrido mais cedo e por isso a taxa de progressão da miopia neles era mais alta que nos escolares dos grupos “experimentais”. Assim, não foi surpresa verificar que os olhos dos estudantes do grupo controle tenham mostrado aumentos ligeiramente maiores de seus comprimentos axiais25. Um ensaio clínico randomizado controlado seria o padrão de ouro para esses tipos de análise25. Tsubota26 respondeu a todas estas indagações declarando que apreciou o interesse e os comentários construtivos sobre o seu estudo e que gostaria de tentar obter mais evidências para estabelecer a hipótese de que a LV previne a progressão da miopia.

Os efeitos da distribuição espectral de luz sobre o desenvolvimento da miopia permanecem um tema importante23. Em macacos27 e em tree shrews28, a luz de comprimento de onda longa (> 650 nm, vermelho) atua como um inibidor forte do crescimento dos olhos, efeito oposto daquele observado em pintainhos29 O papel proposto para a LV no controle da progressão da miopia ainda não foi de todo convincente sendo necessários mais estudos em seres humanos ou em macacos para justificar que a iluminação artificial deva ser revisada para incluir um componente UV, como na luz solar23.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

As causas determinantes do início e progressão da miopia são de natureza multifatorial30. As evidências mostram que fatores ambientais sobrepõem aos fatores genéticos31. A relação entre o nível educacional mais elevado e o desenvolvimento de miopia ainda não está bem compreendida. 30 No entanto, Verhoeven et al. 32 mostraram que os indivíduos com maior risco genético (pais míopes) são mais suscetíveis a desenvolver miopia quando expostos ao ensino superior.

 

5. REFERENCES

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4. Jung SK, Lee JH, Kakizaki H, Jee D. Prevalence of myopia and its association with body stature and educational level in 19-year-old male conscripts in Seoul, South Korea. Invest Ophthalmol Vis Sci 2012; 53: 5579-5583.

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6. Sherwin JC, Reacher MH, Keogh Rh et al. The association between time spent outdoors and myopia in children and adolescent: a systematic review and meta-analysis. Ophthalmolology 2012;119:2141-2151.

7. Williams KM, Bertelsen G, Cumberland P et al. Icreasing prevalence of Myopia in Europe and the impact of education. Ophthalmology 2015;122:1489- 1497.

8. Wong TY, Ferreira A, Hughes R, et al. Epidemiology and disease burden of pathologic myopia and myopic choroidal neovascularization: an evidencebased systematic review. Am J Ophthalmol 2014;157:9-25.

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10. Kocak ED , Sherwin JC. Time spent outdoors and myopia: establishing an evidence base. Eye Sci 2015;30:143-146.

11. Walline JJ, Lindsley K, Vedula SS, et al. Interventions to slow progression of myopia in children. Cochrane Database Syst Rev 2011;12.

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Keila Monteiro de Carvalho
https://orcid.org/0000-0002-7976-8017
http://lattes.cnpq.br/0606513121982929

Fonte de financiamento: declaram não haver

Parecer CEP: não aplicável

Conflito de interesses: declaram não haver

Recebido em: 31 de Agosto de 2018.
Aceito em: 13 de Setembro de 2018.


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